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07/04/2013

Por Edmundo Lima de Arruda Jr Luis Alberto Warat: Ou da fundação da crítica ao direito no Brasil.


Por Edmundo Lima de Arruda Jr

Luis Alberto Warat: Ou da fundação da crítica ao direito no Brasil.


O CPDG/UFSC deve muito de sua história ao pensador do Direito Luis Laberto Warat. Agora que ele se foi mergulhamos na intensidade da falta e ele se faz mais presente que nunca. Advém a indagação sobre qual programa de pós-graduação, com que diferencial? Partindo de que pressupostos metódicos e políticos? Que tipo de mestres e doutores queremos formar, emfim, para que tipo de sociedade? Essas e outras questões nos compelem a rememorar o grande mestre, cuja obra ainda está por ser apreendida em todas a suas nuances e alcances.

Maquiavel mergulhou no âmago da questão do Homem no aspecto da sociabilidade quando afirmou que “não se ama os seus benfeitores”. Não é o caso dos que foram direta ou indiretamente influenciados pelo Professor Warat. Mesmo os que vociferavam impropérios contra o gringo, lá se expressava o contrário, o amor quando não paixão por um intelectual revolucionário. Revolucionário no sentido  de produtor de ideias para constantes giros epistemológicos com efeitos práticos no direito brasileiro. Transcrevo abaixo parte de meu discurso em homenagem a Warat e a Luiz Fernando Coelho, por ocasião da concessão do título de Professor Doutor Honoris Causa pelo Cesusc.


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É com muita, mas com muita emoção mesmo que neste dia, nesta instituição, na presença de amigos e colegas, de irmãos de tantas lutas, temos a oportunidade histórica de reverenciar dois dos mais importantes intelectuais do direito: Luiz Fernando Coelho e Luis Alberto Warat, meus mestres. Mestres de toda uma geração de operadores do direito no Brasil. Fui aluno dos dois, vivenciei os bons tempos do CPGD/UFSC nos quais eles protagonizaram um leal embate de idéias que marcou época, a boa época em que a academia era lembrada e reconhecida como um lugar de pensamento em um campo que no Brasil ousava se afirmar..

Orgulho para as letras jurídicas e em particular para a Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas e para a cultura jurídica catarinense poder promover e compartilhar momento tão sublime . Comemorar não é festejar, mas trazer à memória, resgatar narrativas, os contornos de trajetórias, biografias sem as quais todos ficaremos ainda mais órfãos de uma crítica radical da racionalidade jurídica, empreendida por Warat e Coelho. Os  que fingem não ter sofrido o impacto de Warat e Coelho têm um problema que ultrapassa o campo epistemológico, teórico e mesmo político, descambando para o chão da psicanálise. A amputação presumida de um outro, no caso de gigantes como os eruditos homenageados, condena à condição de anões os desdenhadores. Na idade média havia o sábio ditado: “um anão nos ombros de um gigante enxerga mais longe”...


Conheci Luiz Fernando Coelho há 33 anos, em 1974, na UFPr, quando lá estudava direito. O encontro com Luis Alberto Warat ocorreu em 1976, quando em Brasília. Eu estudava na UnB e tinha como amigo um conterrâneo, Gilmar Ferreira Mendes. Um colega mais atento a saberes extra dogmática jurídica, talvez percebendo nossa paixão por leis, códigos, brocardos, muito contribuiu nos presenteando com um livro de Warat,  A Definição Jurídica. Dois anos depois  decidi a vir a Florianópolis enfrentar o processo seletivo ao Mestrado. No início da primavera de 1978.


Mas nesta ocasião fui designado para me pronunciar sobre um dos homenageados, Prof. Dr Luis Alberto Warat.

Nada como o tempo a permitir o olhar revisionista sobre a época  crítica do direito no Brasil, a década de 80.

Luis Alberto Warat é sem sombras de dúvidas um intelectual no Direito que mais exerceu livremente e criativamente a função social da crítica.

Nos anos oitenta, o máximo que o pensamento crítico ousava na área do direito era imitar tendência dominante nas ciências sociais e da filosofia, qual seja,  o deslocamento do seu objeto, da ideologia (a ser dissolvida ou mesmo desmascarada), para a crítica por dentro do discurso a ser desconstruído. Do Althusser dos aparelhos ideológicos do estado moldado em uma base sedutoramente leninista/positivista, qual seja, a de uma “ciência marxista” forjada no” método dialético”,  se opunha com certo frisson  as boas novas de Marilena Chauí, com sua análise do “discurso competente e outras falas”. Ao menos havia na conhecida professora da USP mérito ao exigir da crítica o mergulho no outro, no caso, o discurso criticado. No objeto estado, direito e em outros topoi do que se tomava como representação transmutada em ideologia, Chauí nos instigava a prescrutar outros sentidos não revelados. Assim a crítica buscava no objeto cognoscível os “não ditos”, os “vazios”, os “brancos”, os “atos falhos”,  explicitando outras falas  latentes no discurso da ideologia dominante. Vínhamos de um período de duas décadas de ditadura militar. Esse o contexto para os primeiros textos de Warat após a fase argentina da sólida formação doutoral inspriado em Vernengo e em toda uma escola crítica estudiosa de Kelsen a partir de teorias da semiologia/semiótica.

Não obstante a crítica ao direito no Brasil produzir seus textos nos contextos da ditadura e ainda dos efeitos de um mundo polarizado cuja guerra fria ainda gerava dividendos (Che Guevara era argentino e sonhava trazer a revolução para o solo latino-americano do sul, Luis Alberto Warat não tinha como escopo de seu trabalho desvelar o mito jurídico, erguendo em seu lugar um “discurso verdadeiro”.  Por oposição a todas as formas de falseamento do real Warat vai se distanciando de todos os discursos totais, moralizantes, neles se incluindo um certo marxismo escatológico, contaminado pelo naturalismo e pelo voluntarismo das segunda e terceira internacionais. Os estragos do cientificismo e do subjetivismo dialético ao marxismo talvez jamais permitam uma recuperação atualizadora do pensamento o mais emancipatório do autor do Capital. Prova dessas tendências retrógadas no pensamento, quando não reacionária, isso mesmo, ultra conservadoras pois despotencializadoras do avanço civilizatório (Stálin matou mais que Hitler...) é o que vemos na América Latina como discurso do socialismo, ou do caminho para o socialismo, sob alianças e projetos nos quais o crescimento econômico atesta a potência Brasil e nos envergonha em termos de I.D.H.

Assim sendo e  nesse aspecto o grande mestre argentino procurava compulsivamente nas suas leituras recursos para pensar diferente do que já se entronizava em nossa academia como discursos burocratizados. Warat perseguia o que de melhor pudesse oferecer à crítica, e aos seus alunos. Daí o ecletismo epistemológico que se vislumbra em seu trabalho. Quem acompanhou o seu trajeto intelectual era obrigado a passar por Saussure, Wittgenstein, Barthes, Bachelard, Foucault, Deleuze, Gattari, Baktin, Lacan, entre tantos outros.

Sem deixar de ser acadêmico afastava-se do academicismo e das filosofias dos “grandes sistemas abstratos”, com evidência da tradição alemã, ainda hoje normativa até as entranhas, e muitas vezes impulsionada pela tarefa impossível de um possível filosofar com critérios “científicos/totalizantes”. Warat adentrava numa tradição de anarquismo conceitual,  aproximando-se do conhecimento via fragmentos, fragmentos para compreender sentidos de narrativas de um mundo mulfacetário, já não mais passível de uma interpretação geral, mas de hermenêuticas em buscas de polissemias, ou sentidos. Essa guinada de Warat causou estranheza e conflitos, inclusive com este seu discípulo, insatisfeito com o que considerávamos, eu e outros, como um “desvio” da esquerda para direita. Como éramos neófitos, hoje nos perdoamos por nossas ignorâncias abissais sobre o real sentido do direito moderno. Warat entendia que não se podia jogar a água suja de uma técnica jurídica ainda pré-moderna, plena de arcaísmos (nepotismo, patrimonialismo, corrupção) com o bebe junto, leia-se, com um projeto moderno que ele, ciente dos limites mas também com os alcances da crítica pós-moderna à Razão Jurídica, denominou inteligentemente como “transmoderna”.

 Warat não acreditava que  filosofia e ciência pudessem dar as mãos sem serem condenadas a um devaneio efêmero, antecâmara de um divórcio com consequências nefastas para ambas, e para o mundo prático, inclusive o da política. Não que não houvesse espaço e necessidade de uma nova ciência, de um novo senso comum teórico, outro brilhante insight do mestre portenho. Warat entendeu um pouco com Comte que qualquer conhecimento elevado, abstrato, necessita ser vulgarizado no sentido ilustrado, socialziado, colocado ao alcance daqueles que o operam.

 Por isso Luis Alberto Warat fugiu de todas as tentações ontológicas, seja ela de base sistêmica, holística, marxista e mesmo freudiana. Sua carnavalização, por vezes causadora de descaso e espanto até mesmo entre operadores dos seus campos de sua interlocução,   constituía-se num afirmar-se do nascimento da possibilidade do campo de legalidade da crítica no Brasil. Talvez esse movimento (acadêmico e político) tenha morrido com a morte do mestre argentino, tomara que não. Esse processo criativo do homenageado tinha que ser necessariamente “caótico” em termos intelectuais  (mesmo nos termos existenciais...). Trabalho extenuante e casamento com o mundo do labor intectual, diuturno. Mais do que isso,  pelo necessário distanciamento das escolas, dos marcos teóricos, das certezas de uma intelectualidade desorientada pela perda dos horizontes utópicos.

Warat enfrentava já  na década de noventa os descaminhos da  na universidade brasileira, uma tendência à formação de igrejas, panelas e grupelhos, que Warat sempre exorcizou, mesmo que por defesa tenha inicialmente reforçado, i, protegendo aos seus.  Não formou propriamente uma escola mas gerou discípulos com autonomia, dentre os quais Leonel Severo rocha, José Alcebíades Jr, Vera Regina Andrade, Sérgio Cademartori, entre outros.  O mesmo ocorreu com o grande Mestre Luiz Fernando Coelho na UFPR. Seus estudos sobre hermenêutica e esforço erudito para problematizar a racionalidade jurídica está presente em todos os docentes daquela instituição, mesmo entre os que o renegam como é o caso de muitos, de Clèmerson Merlin Clève a Wilson Ramos Filho, somente para mencionar dois dos seus mais devotos seguidores. Mas as ideias de Coelho também sofreram o impacto de Warat. Warat tinha um poder de sedução sobre o qual teorizou também. O ato pedagógico é antes de tudo um ato de paixão, sem a qual não haveria mesmo a condição de possibilidade do conhecimento. Suas aulas começavam na sala de aula, ou nela tinha uma confluenência, com a rua, os bares, as festas com seus pupilos. Nessas ocasiões sempre ocorria a dramatização, uma dar marcas de sua pedagogia, revolucionária. Fosse Warat um pesquisador em Paris ele marcaria presença entre os grandes, ao lado de Foucault, Deleuze, Gattari,  entre outros.

Nesse sentido aglutinador de Warat é que sofremos o impacto do pensamento dele, quer queiramos ou não.  Desta maneira de ver o papel de L.A.W. somos todos waratianos no horizonte da crítica, o horizonte à próprio da condição de possibilidade do intelectual. Aí reside a preocupação dos pesquisadores do CPGD ainda irmanados com o que de específico justificou o sonho de um verdadeiro liberal que permitiu a vinda de Warat e Coelho para a fundação do CPGD, além de outros, Osny Régis, Silvio Coelho, Rosa Maria Coelho, José Maria Gomez. Refiro-se ao grande prof. Paulo Henrique Blasi, um liberal que nos traz saudades...

Voltando ao mestre,  Warat seduzia pela interlocução insistente com o pensamento francês, nitidamente o de teor literário. De alguma forma Warat era atraído pelo mosaico dos discursos de diferentes naturezas, que ele busca cruzar, forçando com seu já indicado  ecletismo epistemológico, um singular pensamento pós-moderno,  à sua maneira, antes da onda pós-moderna chegar ao direito. Warat não se enquadrava em uma tendência pós-moderna de cunho excessivamente relativista. Sabia que a realativização convertida em um amsoluto tende a coonestar com o status quo ou a enaltecer o ser hedonista das posições contemplativas. Nada a ver com o agitador L.A.w.

 Hoje compreendo por que nos separamos durante a orientação, assumida prontamente pelo meu primeiro professor de filosofia do direito na UFPR,  Coelho (o segundo foi Roberto Lyra filho, na UnB). Warat não tinha como referência intelectual Gramsci, o homem da causa transformadora/processual no horizonte marxista, embora pontes possíveis podem ser encontradas na maneira de agir de Warat, construindo consensos na academia e entre profissionais do direito. Ele era incansável em atender aos crescentes pedidos de palestras/conferências para magistrados, promotores, etc.

Meu interesse por Gramsci e Althusser me fez se distanciar de warat, mas reconheço em geral os acertos de Warat. A sua estratégia e táticas para desconstruir os saberes jurídicos, permitindo novas fundações epistemológicas para uma nova técnica jurídica, agora com outro sentido em seu sendo comum.  Warat se distanciou de José Afonso Silva, de Dupuy Cortês, de mim mesmo menos por conta de Marx e de Gramsci mas devido à nossa maneira um tanto ortodoxa de ler aqueles autores. Warat desconfiava de toda organicidade colocada como um a priori, colada nesta ou naquela boa causa, por adesão/fé  expressada em radical ética da convicção,  na política. Estávamos juntos na simpatia pelo surgimento/fundação do PT, cedendo à militância do querido Prof. Ubaldo César Balthazar, mas de alguma maneira Warat  percebia com clarividência a distância entre projeto e exercício do poder. Não havia nesse sentido um romantismo nele, mas um certo realismo, se perder a verve pelo pensamento libertário.

Num momento em que não ser petista ou ligado a algum partido socialista nas universidades parecia um passaporte para o exílio acadêmico, Warat soube manter-se autônomo produzindo críticas. Produzir críticas é o que define um intelectual, não a adesão a uma causa política mais ampla, que pode ocorrer. Muitas vezes os efeitos da paixão, no caso pela política desta ou daquela agremiação, embota o pensamento., como toda paixão, ou (des) razão.

Também não se aproximava warat da idéia de intelectual flutuante , atribuída a Manheim . Luis Alberto Warat estava próximo à compreensão de intelctual de Rafaelle Benda, enaltecida hoje por Edward W. Said.  Intelectual  é aquele que pode até ter uma “boa causa”,  mas o intelectual é antes de tudo um produtor de críticas. Gramsci diria que essa critica deve ser primeiramente endereçada aos que compõe o seu grupo corporativo/profissional/ideológico.  Intelectual é aquele que usa a sua metralhadora cultural para desconstruir a obviedade do óbvio, na expressão do grande Darcy Ribeiro. A crítica não se faz em termos de um alvo previamente escolhido em um outro campo distante do seu entorno. Pelo contrário, a crítica deve começar em relação a si mesmo, de forma corrosiva, quase doentia, e deve ser entabulada sempre em relação aos seus mais próximos, àqueles com pertinência ao seu grupo relacional. Penso que warat padecia dessa doença.

Eu não entendia bem essa autonomia intelectual que Warat de alguma maneira professava com seu trabalho Isso levou a algumas  rupturas de diálogo durante a orientação de mestrado, comigo e com outros mestrandos.  Eu era um neófito althusseriano com pouco Marx e nosso grupo foi se distanciando do mestre. . Socorri-me do grande Luiz Fernando Coelho que fraternalmente acolheu minha dissertação sobre San Tiago Dantas. Mas a dissertação, se simplificava a função social das escolas de direito enquanto aparelhos ideológicos de estado (A.I.E), também já estavam na mesma, embora incipientes, conceitos advindos de outros referenciais, com ênfase em Foucault. O direito também concebido como parte de um poder disciplinar, micro social, que não nega as heteronomias mas as ajuda a se reproduzir.

               Claro que ser crítico no Brasil era ser de esquerda. A hegemonia do pensamento marxista no país era de certa tradição legada da segunda internacional.  Por certo, o marxismo acadêmico escapava dessa tradição militante, a exemplo dos trabalhos de Leandro Konder e Carlos Nelson Coutinho.  O nosso erro era subsumir a ciência na política, eliminando as legalidades de ambas. Todo conceito como condição de produção e (re) produção. O intelectual que merecesse essa definição seria o agente social heróico. Na autocrítica de hoje vemos que a pequena burguesia, base da nosso mundo existencial/intelectual, encontrava-se e ainda se encontra marcada pela “dramaticidade” de seu lugar na estrutura social. Uma ‘classe” de difícil identidade, híbrida, confusa, volátil, diferenciada em todas as dimensões da vida, etc.  Isso explica em parte o pêndulo daqueles setores sociais, sempre osclando entre visões de mundo revolucionárias e ingênuas, ambas identificadas a uma certo reforço do status quo na exata medida em que ocupam as pontas sem grande poder de se inserir nas práticas sociais com graus eficaciais de mudança.  Ou aderem ao projeto político vigente das esquerdas de governabilidade, ou o renegam em absoluto, apostando em alternativas utópicas, revolucionárias, sem qualquer pertinência com a sociedade que permita a esta a emancipação real.

           Warat criticava o subjetivismo revolucionário por desrespeito à alteridade, a começar pelo respeito a todas as formas compreensivas do real, do senso comum à mais abstrata reflexão, do trabalho mais ordenado epistemologicamente ao mero relato empírico de uma vivência, pois todas são manifestações de parcelas de verdade. Aí havia um certo historicismo latente em Warat. Ele condenava em suas aulas as desclassificações acadêmicas tão usuais nos CPGDs. Negava ser  parte co-constituinte do “verdadeiro acadêmico”, ironizando os que  expressavam, além da pieguice evidente presente nas práticas do produtivismo burocrático e/ou dos autoelogios e autopromoções corporativas (clube de amigos). Postulava uma trilha segura para evitar autoritarismos conceituais. Sou daqueles que também partilha desta compreensão que o caminho mais rápido para as práticas autoritárias é a intolerância com o trabalho dos outros. Warat sempre foi tolerante com os outros e transitava de maneira plural entre acadêmicos, políticos, magistrados, advogados, poetas, cineastas, enfim. Warat é nesse sentido um intelectual em trânsito.

Obviamente que para os jovens da esquerda do CPGD na década de oitenta, a radicalidade implicava em certa maneira superficial de visualizar o direito. O Direito não seria mais do que um epifenômeno da circulação da mercadoria numa sociedade de classes. Até hoje essa infantilização do pensamento ainda encontra guarida no direito e em certa crítica simplificadora do real. Sem reivindicar o marxismo Warat era mais dialético ao conceituar e viver o direito que muitos autodeclarados marxistas de carteirinha.

A iconoclastia sempre foi um de suas características. Não se seduziu de forma irreversível com o clima ser ou não ser do PT, como afirmamos. Luiz Fernando Coelho certa vez ao apresentar um dos livros de Warat disse que seu principal papel era o de atiçar. Isso mesmo, atiçar a imaginação. Por issso podemos dizer que com Warat tivemos, sem dúvidas,  um alicerce valioso para a crítica que esperamos ainda hoje ver na academia jurídica brasileira. Nosso CPGD deve estar atento aos seus fundamentos, não se deixando enganar por uma visão de ciência que burocratizada, acaba premiando a melhor estatística, sem maiores considerações sobre conteúdos e validade de artigos e teses. Um livro por vezes necessita de décadas para ser compreendido e impactar as práticas sociais no direito, mormente se considerarmos que nossa cultura jurídica ainda recepciona e reproduz nichos de pré-modernidade, renovando-os, sofisticando-os enquanto espaços particulares dentro das esferas públicas.

A obra que Warat nos herda ainda precisa ser estudada em sua profundidade, repito. Não se trata de explicitar o que ele quis dizer com tantas incursões conceituais e com extrema sensibilidade. Seus escritos são por regra ensaísticos, quando não poéticos. Resulta daí um alcance ainda maior a ser redescoberto.  Warat está menos para uma ideia de conhecimento/ciência e mais para um apelo às possibilidades de conceitos em termos hermenêuticos, ou dos sentidos possíveis que sua obra tensiona.







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