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10/01/2013

O ART. 265 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL É INCONSTITUCIONAL? Autor: André Gonzalez Cruz


O ART. 265 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL É INCONSTITUCIONAL?

Autor: André Gonzalez Cruz é Analista Ministerial e Assessor de Procurador de Justiça no Ministério Público do Maranhão.
Artigo publicado na Revista Juris Itinera de 2012.


Muito se tem discutido atualmente se o art. 265 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 11.719/2008, é inconstitucional ou não. Assim, antes de adentrar no mérito da questão, necessária a transcrição do referido dispositivo, litteris:
Art. 265. O defensor não poderá abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.
§ 1o A audiência poderá ser adiada se, por motivo justificado, o defensor não puder comparecer.
§ 2o Incumbe ao defensor provar o impedimento até a abertura da audiência. Não o fazendo, o juiz não determinará o adiamento de ato algum do processo, devendo nomear defensor substituto, ainda que provisoriamente ou só para o efeito do ato.
Cumpre destacar que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, propôs, perante o Supremo Tribunal Federal, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, protocolada sob o nº 4.398, requerendo a declaração de inconstitucionalidade do citado art. 265, no que diz respeito à multa prevista para o defensor que abandonar o processo, salvo por motivo imperioso, comunicado previamente ao juiz.
Entretanto, a Corte ainda não se manifestou definitivamente sobre a questão, estando os autos conclusos ao seu relator, Ministro Dias Toffoli, desde 29/09/2010.
Nesse diapasão, argumenta a OAB que a nova redação do art. 265 do Código de Processo Penal tornou a advocacia criminal um risco desmedido, tendo em vista que esta é a única previsão legislativa existente no país que dispensa, para aplicação de uma pena, todas as garantidas constitucionais do cidadão.
Dessa forma, assinala que se trata, na verdade, de violação manifesta ao livre exercício da advocacia1, porquanto retira da Ordem dos Advogados do Brasil o dever-poder de punir os seus inscritos2, além de, sobretudo, prever a aplicação de pena sem o devido processo legal e sem assegurar ao profissional o exercício do contraditório e da ampla defesa, conforme dispõe o art. 5º, LIV3 e LV4, da Constituição Federal.
Aduz ainda que o dispositivo legal impugnado extrapola todos os padrões de razoabilidade e de proporcionalidade, pois a norma determina a aplicação de punição a um fato, presumidamente censurável, sem que, para tanto, se instaure o devido processo legal e sem garantir a possibilidade de exercício do direito de defesa e do contraditório.
Assevera também que a sistemática adotada na novel redação do art. 265 do Código de Processo penal autoriza a apenação de advogado sem sequer ouvir a parte penalizada que, lembre-se, não é parte no processo em que se determina a condenação.
E, pior, a norma gera uma condenação absoluta decorrente de uma presunção iuris tantum de culpa, a qual não pode ser discutida previamente e nem revista em sede recursal, traduzindo-se evidentemente na negativa absoluta da garantia constitucional do devido processo legal, cuja outorga de poder ao magistrado para apenação impulsiona arbitrariedades não compatíveis com as prerrogativas profissionais dos advogados.
A Ordem dos Advogados do Brasil pontua ainda que a expressão “abandonar o processo”, existente no dispositivo combatido, não recebeu do legislador a tipificação devida, nem direta ou indireta, não apresentando critérios objetivos e delimitadores da extensão da expressão, daí a inviabilidade de sua aplicação não pelo prudente arbítrio do julgador, mas sim pela arbitrariedade que congrega a possibilidade de apenação sem o devido processo legal e sem garantir o contraditório e a ampla defesa.
Registra que a única forma de estimar o que significa “abandonar o processo” seria perquirir acerca da extensão gramatical do termo “abandono”, tendo-se, assim, 02 (duas) interpretações possíveis: no sentido absoluto ou no sentido relativo.
No seu sentido absoluto, o termo “abandono” seria “deixar, largar”, revelando a impropriedade de que o advogado não poderia se afastar fisicamente do processo, pois estaria “deixando-o” ou “largando-o”. E, portanto, mesmo que o “abandono” não fosse absoluto, mas momentâneo, incidir-se-ia a regra impugnada.
Isto, obviamente, jamais serviria para a aplicação da norma, pois representa uma condição irracional ao extremo e representaria a subversão da razoabilidade, sendo clarividente que o advogado não precisa andar com o processo sob sua guarda 24 (vinte e quatro) horas por dia.
Já quanto à compleição relativa da expressão “abandonar o processo”, a OAB frisa que esta revela a ideia de um desamparo total e absoluto do objeto, não com caráter momentâneo, mas definitivo, isto é, redunda na ideia de uma desistência indevida e não comunicada ao juízo, com efeitos permanentes.
Assim, não é a situação da ausência a um ato processual que configura o dito abandono do processo. Talvez pudesse caracterizar, desde que comprovada a intenção dirigida ao desprezo, um abandono do ato, mas nunca da universalidade do processo, a qual é amparada pelo art. 265 do Código de Processo Penal.
A Ordem dos Advogados do Brasil conclui, nesse espectro, que o abandono não serviria para preencher o requisito da lei, pois a extensão da expressão “abandonar o processo” como simplesmente “abandonar um ato do processo” representaria franca interpretação extensiva, o que, em matéria de punição, é absolutamente vedado.
Ora, se fosse possível adotar tal intepretação extensiva e contrária à lógica, ainda assim se teria que admitir que a aplicação da expressão “abandonar o processo” exige voluntariedade, isto é, exige comportamento consciente e volitivo de inação ou de abandono, pelo fato de que este é dependente da vontade do agente e não se admite, pela própria natureza gramatical e de significância do verbo “abandonar”, que o mesmo se concretize, na prática, sem que o agente tenha a vontade dirigida para o abandono.
Destarte, consoante a OAB, cumpriria verificar em cada caso a existência do dolo direcionado ao ato, pressuposto incompatível com a aplicação da multa na forma sumária prevista no dispositivo vergastado, uma vez que não permite a verificação deste dolo.
Tal intento, segundo a inicial da ADI nº 4.398, só poderia ser verificado pela contumácia ou, talvez, pelo reconhecimento da intenção de não atuar, mas tais hipóteses não são verificáveis no momento em que se aplica a penalidade, e, a rigor, os critérios subjetivos de conveniência para a atuação do defensor no processo é matéria correlata ao atendimento pactuado entre o advogado e seu cliente, e, portanto, infere-se dentro da autonomia contratual da parte e nos critérios de conveniência da defesa.
O que importa ressaltar, nessa linha de raciocínio, é a impossibilidade de, no próprio ato em que o advogado não comparecer, o juízo ter qualquer espécie de ciência acerca das motivações de seu não comparecimento e, não tendo como ter ciência desta motivação, nem sendo onisciente, não pode saber se houve abandono do processo ou se houve impossibilidade de comparecimento baseada em razões de força maior ou outra coisa qualquer.
E não havendo possibilidade de aferir, quando do multicitado ato, o elemento subjetivo que autorizou a conduta, o juiz só poderá proceder através de uma presunção, que, por expressa determinação constitucional, só poderá ser de inocência.
Alega a Ordem dos Advogados do Brasil que não socorreria a legitimidade da norma atacada o disposto no seu § 2º, que possibilita a justificação prévia – entenda-se até a instalação da audiência – das razões do não comparecimento, pois, por óbvio, isto não serviria para afastar a incidência do contraditório na formação da convicção da dita negligência do não comparecimento, tendo em vista que, até o momento da instalação da audiência, não há o que contraditar, ou seja, não se operou o juízo de presunção e até mesmo o suposto ato punível ainda não se concretizou.
Da mesma forma, nas hipóteses de força maior ou de erro justificável para o não comparecimento ao ato processual, a possibilidade de exercício do contraditório restaria prejudicada, ou seja, o retromencionado § 2º só visualiza causa pré-existente de motivação, desconsiderando as causas de impossibilidade que podem ocorrer em pouco tempo antes da audiência – e, por isto, não podem ser apresentadas até a sua abertura –, mas que são plenamente capazes de impossibilitar a presença do advogado no aludido ato. E cita como exemplo o caso do advogado que sofre um acidente a caminho da dita audiência, que não poderá justificar sua ausência até a instalação do ato.
Derradeiramente, sustenta que o art. 265 do Código de Processo Penal revela contrariedade ao art. 7º, IV5, parte final, da Constituição Federal, pois utiliza o salário-mínimo como fator de indexação para a multa, bem como que o dispositivo vergastado permite a aplicação de penalidade de forma concorrente ao contido na Lei nº 8.906/94, a qual dispõe sobre o Estatuto da Advocacia, haja vista que o art. 34, XI, desta última, estabelece infração disciplinar ao advogado que abandonar a causa sem justo motivo ou antes de decorridos 10 (dez) dias da comunicação da renúncia.
Assim, criam-se 02 (dois) subsistemas de punição aos advogados, retirando da OAB, contudo, a possibilidade de aplicação da penalidade em face do princípio da vedação do bis in idem, resultando violação ao art. 5º, XIII, da Constituição Federal.
Entretanto, discorda-se de toda a argumentação expendida anteriormente pela Ordem dos Advogados do Brasil, conforme restará sobejamente demonstrado abaixo.
Tal conclusão é chegada quando se analisa atentamente o que estipula o art. 265 do Código de Processo Penal e os regramentos contidos na Constituição Federal.
Cumpre ressaltar que, ao contrário do afirmado pela OAB, o juiz, quando da audiência em que ausente o defensor, não está obrigado a aplicar, de logo, a penalidade de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, o que implicaria violação manifesta aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Como pontuou a Ordem dos Advogados do Brasil na ADI nº 4.398, a Lei nº 11.719/2008 promoveu significativas alterações nas disposições do Código de Processo Penal, destacando-se, dentre elas, a nova redação do art. 265, cuja essência normativa, contudo, não sofreu alteração substancial, eis que a redação anterior previa a apenação do defensor que abandonasse o processo, ao passo que a sua novel redação mantém esta mesma disposição.
Não obstante, registra a OAB que, muito embora já existisse tal regramento no ordenamento jurídico, não existiam notícias de sua aplicação, nem de condenação de advogado ao pagamento das multas que estipulava. É que na redação anterior o efeito prático consistia em autorizar o magistrado a não adiar a audiência ou o ato processual em face da ausência do advogado.
Desse modo, constata-se claramente que só proposta a referida Ação Direta de Inconstitucionalidade em face da interpretação dada pelos magistrados, em concreto, à novel redação do art. 265 do Código de Processo Penal, ou seja, no sentido de que o juiz deve aplicar a penalidade de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos ao defensor que abandonar o processo, salvo por motivo imperioso comunicado previamente, já naquela audiência em que o mesmo não pode comparecer.
É cristalino que este resultado desvirtua completamente as garantias da ampla defesa e do contraditório. Todavia, em nenhum momento a norma atacada propugna que este deve ser o modo de proceder do magistrado.
No mais, constata-se que o regramento contido no art. 265, caput, do Código de Processo Penal, não restringe o ato de “abandonar o processo” à simples ausência do defensor à audiência, tendo em vista que este pode “deixar” ou “largar” o processo em qualquer momento processual, como, por exemplo, não ofertando as alegações finais.
Dessa forma, o que se tem em questão é a melhor intepretação conferida ao regramento infraconstitucional vergastado, o que é matéria afeita ao Superior Tribunal de Justiça, e não ao Supremo Tribunal Federal.
Nesse ponto, sábia é a interpretação da expressão “abandonar o processo”, no seu sentido relativo, dada pela própria Ordem dos Advogados do Brasil, de que aquela revela a ideia de um desamparo total do objeto, não com caráter momentâneo, mas sim definitivo, isto é, redundando na ideia de uma desistência indevida e não comunicada ao juízo, com efeitos permanentes.
O Advogado-Geral da União se manifestou nesse sentido nos autos da ADI nº 4.398, em face do que dispõe o art. 103, § 3º6, da Constituição Federal, in verbis:
Não assiste razão ao requerente, pois sua pretensão tem por fundamento uma interpretação equivocada do artigo 265 do Código de Processo Penal, na redação que lhe foi conferida pelo artigo 1º da Lei federal nº 11.719/08. A norma impugnada não impõe multa ao advogado que faltar a certo ato processual, mas àquele que abandonar o processo de maneira injustificada, colocando em risco a defesa técnica do réu. Assim, não se pode confundir a ausência à audiência designada pelo juízo com o abandono do processo. Com efeito, o artigo 265 do Código de Processo Penal não impõe multa em razão de simples falta injustificada do advogado à audiência criminal de instrução ou de instrução e julgamento, conforme se infere de seus termos expressos. É preciso, de fato, que tenha havido o abandono da defesa pelo causídico, sem justificativa exposta ao juiz, de maneira a gerar risco para a própria atuação jurisdicional futura, que poderá ser questionada por obra da omissão do defensor. Essa omissão, como se sabe, pode revelar-se como estratégia torpe, dando azo à nulidade absoluta do feito por violação ao contraditório e à ampla defesa. É por essa razão que o caput do artigo 265 do Código de Processo Penal é claro ao não especificar qual tipo de ausência redundará na imposição da penalidade pecuniária, pois o que gera essa pena, na adequada interpretação do artigo, é o abandono injustificado do processo. Os §§ 1º e 2º do artigo 265 do Código de Processo Penal tratam, unicamente, de disciplinar as hipóteses de não comparecimento do advogado à audiência. Nos termos de referidos dispositivos, caso seja demonstrada a existência de justo impedimento para o seu comparecimento a referido ato, o juiz deverá adiar a audiência, privilegiando a defesa pelo advogado da confiança do réu (pois foi por este escolhido). Já no caso de ausência injustificada, o juiz deverá praticar o ato processual com a nomeação de defensor substituto. Nenhuma dessas situações, entretanto, é fato gerador da incidência da multa prevista no caput do artigo impugnado. Desse modo, somente o fenômeno processual do abandono, que se revela juridicamente muito mais grave do que a ausência a um ato processual específico, pode ensejar a multa definida no caput do artigo 265 do Código de Processo Penal. O conceito de abandono do advogado no processo penal pode ser extraído, por analogia, do teor do artigo 60, inciso I, do Código de Processo Penal, que cuida da perempção por inação do querelante. A redação de referido dispositivo é similar, inclusive, ao texto do artigo 267, inciso III, do Código de Processo Civil, que cuida do abandono do autor em processos dessa espécie. Em ambos os dispositivos, dispõe-se que haverá abandono quando, por não promover os atos e diligências que lhe competem, o autor permanecer omisso por mais de 30 (trinta) dias. Assim, não existe ofensa à proporcionalidade, pois a garantia de segura prestação jurisdicional, na seara criminal, é um bem coletivo que justifica a aplicação da multa, no quantitativo legalmente definido. Trata-se de emanação do poder de polícia judiciária, em que o interesse coletivo deve sobrepor-se ao interesse individual do advogado que, com sua conduta desidiosa e intencional, põe em risco a validade da sentença vindoura. Também não se está diante de afronta ao princípio do amplo acesso à jurisdição, pois o artigo 265 do Código de Processo Penal objetiva, na verdade, proteger a segura prestação jurisdicional. A multa busca evitar, inclusive, a prescrição da pretensão punitiva estatal, pois processos que sejam declarados nulos, por falta de defesa técnica, não interrompem o efeito deletério do tempo. Por outro lado, verifica-se que o contraditório e a ampla defesa foram observados no procedimento definido pelo artigo em debate. A penalidade pecuniária somente será aplicada se o advogado colocar-se deliberadamente em posição omissa. A própria norma questionada assegura, antes de tudo, a possibilidade de manifestação do advogado, deferindo-lhe o poder de informação ao Judiciário sobre impedimentos e ausências forçadas. Estando razoavelmente justificada a falta, não haverá abandono e, consequentemente, não será aplicada multa.
Tal posicionamento, inclusive, completa-se ao parecer da Procuradoria-Geral da República naquela Ação Direta de Inconstitucionalidade, litteris:
O novo texto, cuja modificação, no ponto impugnado, esteve limitada à atualização do valor da multa, alinha-se ainda mais às orientações do processo penal na atualidade, especialmente aquelas que dizem com a razoável duração do processo e a defesa efetiva do réu. A norma, por outro lado, ao contrário do que propugna o requerente, vem em reforço ao art. 133 da CF, pois reconhece que a ausência reiterada e injustificada do advogado é circunstância que compromete de tal forma a administração da Justiça que merece ser sancionada. A incidência da multa, portanto, ocorrerá apenas – repita-se – em caso de abandono do processo. [...] A norma atende ao princípio da proporcionalidade em todas as suas vertentes: é adequada, porque tem em vista uma prestação jurisdicional célere, com a garantia de uma defesa efetiva; é necessária, como único meio efetivo de inibir a desídia de advogados e os prejuízos processuais daí decorrentes; e é proporcional, porque permite ao juiz no caso concreto, dentro dos limites legais, aplicar o quantum adequado à conduta que se busca imprimir. Convenhamos, ainda, que o valor que oscila de 10 a 100 salários-mínimos muito dificilmente levará um advogado à absoluta insolvência. De resto, as garantias do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da inafastabilidade do controle jurisdicional também serão observadas, na medida em que o advogado não está impedido de utilizar-se dos meios processuais disponíveis para impugnar a decisão que impõe a multa. Ante o exposto, o parecer é pela improcedência da ação.
Noutro giro, além de não conflitar com as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório, o art. 265 do Código de Processo Penal ainda se alinha com as orientações do moderno processo penal brasileiro, no qual ganham destaque a efetiva defesa do acusado e a razoável duração do processo, capituladas, respectivamente, no art. 5º, LV e LXXVIII7, da Constituição Federal.
Assim, segue o Brasil a linha adotada no sistema norte-americano, no qual é dado ao juiz, segundo Barbosa Moreira (2001, p. 173), “no âmbito do chamado criminal contempt power, punir o advogado que deliberadamente viole os deveres para com o próprio órgão judicial”.
Mendonça (2009, p. 206-207) comunga desse mesmo raciocínio, conforme se vê a seguir.
No caput, manteve-se o dever de o defensor não abandonar o acusado, a não ser por motivo imperioso. O abandono de que está tratando o artigo em estudo é apenas o definitivo, ou seja, aquele em que o advogado se afasta do processo de maneira permanente. Não se está a cuidar da hipótese de ausência momentânea do advogado a determinado ato. A inovação fica por conta da necessidade de que esta comunicação seja prévia, ou seja, antes de abandonar a defesa do acusado, sob pena de pesada multa de 10 a 100 salários mínimos – valor este que foi atualizado –, sem prejuízo das demais sanções cabíveis, inclusive perante a Ordem dos Advogados do Brasil. A necessidade de comunicação prévia visa evitar a ocorrência de eventuais nulidades, em razão de mácula ao direito de defesa. No entanto, entendemos que a atualização da multa visa, também, assegurar ao magistrado poderes para punir aquele causídico que se mostrar descompromissado com o Poder Judiciário, em sentido próximo ao contempt of court, do direito norte-americano. Nesta senda, não vislumbramos inconstitucionalidade no referido dispositivo, desde que instaurado um incidente, em que o advogado tenha oportunidade para se defender, em atenção ao devido processo legal. Cumpre destacar que o art. 34 da Lei nº 8.906/1994 qualifica como infração disciplinar “abandonar a causa sem justo motivo ou antes de decorridos dez dias da comunicação da renúncia”, podendo o advogado, sem prejuízo da sanção prevista no presente artigo, sofrer sanções no âmbito disciplinar da Ordem dos Advogados do Brasil.
No mesmo sentido é a lição de Nucci (2008, p. 565), que assevera:
Por isso, a partir da edição da Lei 11.719/2008, o defensor pode abandonar o processo por motivo imperioso, comunicando previamente o juiz. Se a comunicação não for feita de antemão, fica sujeito a uma multa de 10 a 100 salários mínimos, sem prejuízo de outras sanções, como, por exemplo, de ordem administrativa (OAB). A fixação da multa deve observar a capacidade econômica demonstrada pelo causídico. Logicamente se a comunicação prévia for realizada, mas não se tratar de motivo imperioso, está-se burlando, do mesmo modo a lei, podendo o magistrado aplicar a multa supramencionada e dar continuidade aos trabalhos, nomeando substituto.
Observe-se ainda que tais autores afirmam também que a referida penalidade de multa é independente da possível apuração administrativa da Ordem dos Advogados do Brasil, o que vai de encontro ao sustentado na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.398, de que o art. 265 do Código de Processo Penal representa violação manifesta ao livre exercício da advocacia, porquanto retira daquela Instituição o dever-poder de punir os seus inscritos, em face da vedação do bis in idem.
E isto se deve ao fato de que a referida penalidade de multa emerge como um instrumento colocado à disposição do juiz, para a garantia de uma eficiência prestação jurisdicional, não possuindo, assim, natureza disciplinar, e, portanto, nada interferindo na atuação da Ordem dos Advogados do Brasil. Assim, o dispositivo atacado não viola os arts. 5º, XIII, e 133 da Constituição Federal.
Por último, quanto à alegação de que o art. 265 do Código de Processo Penal revela contrariedade ao art. 7º, IV, parte final, da Constituição Federal, tendo em vista que utiliza o salário-mínimo como fator de indexação para a multicitada multa, também sem razão. Isto porque não existe impedimento legal à fixação de penas pecuniárias com base no salário-mínimo, mas exclusivamente a sua utilização como indexador de base de cálculo de vantagem ou para outros fins de natureza econômica que o constituam em fator inflacionante, como ressaltou a própria Procuradoria-Geral da República.
Tanto é verdade a supracitada assertiva que a Súmula Vinculante nº 04 do Supremo Tribunal Federal estabelece que, “salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão”, o que justamente não ocorre no caso da multa aplicada ao defensor pelo abandono do processo.
Caso assim não fosse, pontua o Advogado-Geral da União, as penas criminais pecuniárias, expressões do jus puniendi, jamais poderiam tomar como base o salário-mínimo, que é levado em conta para a definição do dia-multa, conforme demonstrado no art. 498, caput e § 1º, do Código Penal.
A questão da constitucionalidade do dispositivo vergastado já foi apreciada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, tendo este se manifestado pela adequação à Constituição Federal, desde que o magistrado não aplique a mencionada multa quando da primeira audiência em que ausente o defensor, assinalando, assim, as balizas para a sua interpretação, como revelado abaixo em ordem cronológica.
Para aplicação da multa prevista no art. 265 do CPP, é preciso que o advogado seja ouvido sobre o motivo por que deixou de atuar no processo, em obediência ao princípio do contraditório.9
1. "Não se vislumbra inconstitucionalidade do art. 265, caput, do CPP, ou ofensa aos princípios do juiz natural, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, em se tratando de sanção de natureza processual, incluindo-se na esfera de discricionariedade regrada do juiz natural do processo, sendo exercidos a ampla defesa e o contraditório através da possibilidade de impugnar a decisão atacada por pedido de reconsideração ou mandado de segurança" (STJ - RMS 31966/PR, Relator Ministro Adilson Vieira Macabu (Desembargador Convocado do TJ/RJ), 5ª Turma, julgado por unanimidade em 14/04/2011, publicado no DJe de 18/05/2011). 2. No caso em comento, o ora impetrante, apesar de ter sido, por duas vezes, regularmente intimado, não apresentou as alegações finais nos autos do processo nº 2007.38.15.000903-5/MG e, além disso, não apresentou nenhuma justificativa, o que levou o MM. Juízo Federal a quo a aplicar-lhe multa no valor de 10 (dez) salários mínimos, por abandono de causa. Dessa forma, a decisão impugnada encontra respaldo no art. 265, caput, do CPP, que é expresso ao afirmar que "O defensor não poderá abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais sanções cabíveis". 3. A decisão impugnada se encontra suficientemente fundamentada, não apresentando eiva de ilegalidade ou abuso de poder que pudesse justificar a concessão do writ. 4. Mandado de segurança denegado.10
1. Regularmente intimado, por 3 vezes consecutivas, num prazo de 4 meses, para a apresentação de alegações finais, só vindo a fazê-lo na quarta intimação e após aplicação de multa na forma do art. 265 do CPP, caracterizado está o abandono da causa. 2. Correta a aplicação de multa de 10 (dez) salários mínimos. 3. Segurança denegada.11
I - A decisão que aplica multa ao advogado do réu por abandono da causa é impugnável por meio de recurso de apelação, a teor do disposto no art. 593, II, CPP. II - Caracterizado o abandono da causa pelo patrono do réu, por duas vezes, de forma injustificada, irretocável o decisum que aplicou ao recorrente multa ao recorrente, a teor do art. 265 do CPP. III - Não obstante a gravidade dos fatos, em face do abandono de causa criminal por advogado, mormente por se tratar de réu preso, o que permite a fixação da multa em patamar maior que o mínimo, inexistem outros fundamentos para a exasperação da multa aplicada, que varia entre 10 (dez) e 100 (cem) salários mínimos, em seu grau máximo. Redução da multa para 20 (vinte) salários mínimos. IV - Recurso em Sentido Estrito conhecido como apelação e parcialmente provido.12
A matéria também já foi submetida à apreciada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que se manifestou da mesma forma, conforme se vê fartamente descrito a seguir.
1 - Inexiste autorização para declaração incidental da inconstitucionalidade do artigo 265 do Código de Processo Penal sem afronta ao princípio da cláusula de “Reserva de Plenário” (art. 97 da CF/88). 2 – Não há necessidade de instauração de procedimento contraditório específico para aplicação de multa prevista no artigo 265 do CPP, eis que o contraditório e a ampla defesa estão resguardados pela possibilidade de oferecimento de recursos ou outras medidas de impugnação inerentes ao próprio processo, que se desenvolve sob o crivo do contraditório. 3 - Não se caracteriza o abandono da causa se não há a constituição regular dos causídicos para patrocínio da causa antes de sua intimação para realização do ato em relação ao qual se considerou a defesa inerte. 3 - A nomeação da Defensoria Pública da União para atuação na defesa de acusados não pode ser condicionada à verificação de sua hipossuficiência econômica. 4 – Ordem concedida, ressalvada a eficácia da multa aplicada posteriormente, que não foi objeto do presente writ.13
1. Mandado de segurança impetrado contra ato praticado pelo MM. Juiz Titular da 1ª Vara Federal Criminal de Vitória/ES, que, nos autos da ação penal nº 2007.5001.013851-3, aplicou aos Impetrantes a multa prevista no artigo 265, caput, do Código de Processo Penal, no valor de R$ 5.100,00 (cinco mil e cem reais), por não terem comparecido à audiência de instrução e julgamento. 2. A aplicação da multa prevista no artigo 265 do Código de Processo Penal é cabível ao advogado que abandona o processo. E o abandono de processo ocorre quando o advogado regularmente constituído deixa de promover os atos que lhe competem, de maneira reiterada e definitiva, expressa pela ausência absoluta nos autos. 3. Constata-se que os Impetrantes deram regular seguimento à defesa do acusado no curso da Ação Penal originária, tendo, como se verifica às fls. 63/67, apresentado Alegações Finais defensivas. 4. Ainda que a justificativa para o não comparecimento à audiência não tenha sido aceita pelo magistrado a quo, trata-se de um fato isolado, inexistindo qualquer outro indicativo que demonstre desídia ou abandono da causa por parte dos Impetrantes, que prosseguiram na defesa de seu constituinte, impondo-se, por conseguinte, a concessão da segurança para cancelar a multa aplicada. 5. Segurança concedida.14
- A constitucionalidade do art. 265 é objeto da ADI nº 4398, mas não há medida cautelar deferida. - As garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa não são violadas pela imposição da multa prevista na novel dicção do art. 265 do CPP, que restringiu a aplicação dessa penalidade ao defensor que abandonar o processo sem justo motivo, pelo que exsurge evidente que existe espaço para a manifestação, em contraditório, do defensor sancionado. A inexistência de incidente processual específico para oportunizar a ampla defesa do advogado não significa que a aplicação da multa seja automática - A inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações no exercício da profissão (CRFB, art. 133) não é irrestrita, podendo ser contida nos limites da lei. - Não há previsão constitucional no sentido de a Ordem dos Advogados do Brasil deter a competência exclusiva para sancionar disciplinarmente advogado. A decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI nº 2652/DF não acolhe o argumento da competência exclusiva. Ao contrário, explicita que advogados podem estar submetidos concomitantemente ao Estatuto da OAB e a outro regime jurídico. - O art. 14 do CPC não serve de parâmetro de comparação adequado, porquanto da sua aplicação estão expressamente excluídos os advogados, ao contrário do que ocorre com o art. 265 do CPP, destinado tão-somente a estes. ABANDONO DE CAUSA. INEXISTÊNCIA. FATO ISOLADO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO PATROCINADO. - O abandono de causa capaz de justificar a aplicação da multa prevista no art. 265 do CPP demanda que o defensor regularmente constituído reiteradamente deixe de promover os atos necessários à defesa do acusado, não bastando uma única omissão - como o não comparecimento à audiência - para caracterizá-lo. - A ausência do advogado, sem motivo razoável, pode indicar desídia do profissional e, ainda, abuso do direito, na hipótese de restar configurado o interesse em atrapalhar a regular marcha processual e causar tumulto mediante a postergação de ato do processo, mas não configura, por si só, abando de causa. - A inércia do advogado não influenciou na defesa da parte patrocinada, posto que sua manifestação, exigida pelo Juízo impetrado, destinava-se tão somente ao exercício da ampla defesa em relação à própria aplicação da multa questionada.15
E assim ainda foi o caso do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
1. Réu condenado pela prática do crime de apropriação indébita previdenciária. 2. Recurso da defesa argüindo nulidade decorrente da nomeação de defensor ad hoc para apresentação de alegações finais, sem intimação prévia do réu para constituir novo defensor. 3. Nulidade patente. Constatado o abandono de causa por parte do defensor constituído, a providência adequada era determinar a intimação do réu para lhe dar ciência do ocorrido e a chance de constituir um novo defensor, de sua confiança e em prazo razoável. Ao nomear diretamente o defensor para o ato de apresentação de alegações finais, o MM. Juízo incorreu em nulidade, violando o artigo 263 do CPP, nos termos do artigo 564, IV, do mesmo Estatuto, revelando-se inequívoco o prejuízo diante da condenação do apelante. 4. Reiterados precedentes do Superior Tribunal de Justiça, reconhecendo a nulidade em situações análogas. 5. Por outro lado, comprovado o abandono de causa pelo anterior causídico, impõe-se a aplicação de multa, nos termos do artigo 265 do CPP, em valor que seja compatível com a fase processual e com a importância do ato omitido. Neste caso concreto, tratando-se de alegações finais de defesa, peça da mais alta relevância no processo penal, por ter o condão de definir os rumos do feito e sem a qual não se pode dar cabo do procedimento, gerando mais lentidão no processamento e relativa demora para sua ausência ser devidamente equacionada pelo condutor do processo, a multa deve ser de 50 salários mínimos, vigentes à época do abandono, corrigidos monetariamente. 6. Feito anulado a partir, inclusive, da nomeação da defesa ad hoc, com a urgente baixa dos autos ao Juízo monocrático, cabendo aos atuais defensores constituídos a apresentação das alegações finais, para a prolação de nova sentença. 7. Preliminar de nulidade acolhida. Aplicação de multa por abandono do processo. Expedição de ofício à Procuradoria da Fazenda Nacional. Exame do mérito recursal prejudicado.16
Outro não é o entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, como demonstrado abaixo.
1. A correição parcial não é meio processual adequado a atacar decisão que impõe a aplicação da multa prevista no artigo 265 do Código de Processo Penal. 2. Recebimento da correição parcial como mandado de segurança. Aplicação do princípio da fungibilidade. 3. A adequada interpretação do instituto do abandono do processo, preceituado no artigo 265 do Código de Processo Penal, reclama animus de definitividade, ocorrente na hipótese em que o advogado abstém-se de promover, à míngua de motivo imperioso, os atos e diligências que lhe competiam durante o curso processual de maneira reiterada, que se expressa pela absoluta ausência nos autos, demonstrando a vontade de não atuar em favor do mandante. É situação excepcional que exige o elemento subjetivo de desídia na condução defensiva do feito, em manifesto prejuízo do constituinte, já em visas de se tornar indefeso, para só então cogitar-se da aplicação da sanção pecuniária correspondente, até mesmo porque contemplativa de altos patamares valorativos, que devem ser sopesados com prudência para que não sejam excedidos os limites da razoabilidade. 4. Caso em que, na conjectura do feito, não há lugar para um juízo categórico que abone o cabimento da medida adotada. Nada obstante a ausência injustificada à audiência, recobrou o advogado a condução do processo, apresentando alegações finais, minimizando ou mesmo impedindo, com essa postura, eventuais prejuízos ao seu constituinte, a atestar que não houve afastamento definitivo em relação ao patrocínio da causa penal.17
E não foi diferente no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, litteris:
1-Preliminar, arguida pela Defensoria Pública da União, representante do acusado, de necessidade de aplicação da penalidade de multa ao advogado constituído em face do abandono da causa, prevista no Artigo 265 do Código de Processo Penal, bem como no Artigo 34, XI, da Lei nº 8906/94 (Estatuto da OAB). 2-Inexiste desídia, por parte do causídico constituído, pelas próprias peculiaridades ínsitas a um processo penal com réu preso, estrangeiro (norte americano), sem falar o nosso idioma. 3-Ademais, referido causídico, na oportunidade da intimação do acusado do teor da sentença condenatória, protocolizou petição pugnando pela apresentação das razões recursais, nesta instância (CPP, Art. 600, § 4º), ato processual que foi concluído por defensor público, nomeado pelo juízo, em face de o réu, apesar de intimado, não ter constituído outro causídico, o que afasta a tese de ocorrência de prejuízo ao réu.18
Entretanto, mais valiosa ainda é a interpretação dada pelo Superior Tribunal de Justiça à matéria, tendo em vista que é sua função tutelar a unidade do direito federal.
1. Não é lícito ao Advogado abandonar sem justo motivo previamente comunicado ao Juízo, o patrocínio da causa, no momento da realização de ato processual ao qual, devidamente intimado, deve comparecer, por configurar, prima facie, menoscabo às atividades do Poder Judiciário, nas quais desempenha função essencial e insubstituível (art. 133 da Carta Magna). 2. Não se deve confundir a ausência a determinado ato processual com o abandono do processo, tal como previsto no art. 265 do CPP (redação da Lei 11.719/08), tanto que cumpre ao Juiz, em tal hipótese, se for o caso, nomear defensor substituto, como dispõe o art. 265, § 2º do CPP (redação da Lei 11.719/08), mas sem afastar a atuação do causídico em atos processuais futuros. 3. A aplicação de qualquer sanção, ainda que de cunho administrativo, mas com reflexo patrimonial, se sujeita aos rígidos padrões de procedimento que integram o due process of law (justo processo jurídico), que não admite a noção de responsabilidade objetiva por ato infracional disciplinar, a exigir a devida apuração de sua prática e do correspondente contexto circunstancial em que ocorreu, haja vista o disposto nos incisos LIV e LV do art. 5o. da Constituição Federal. 4. Cabe ao Juiz prover medidas de pronta eficácia para impedir delongas processuais, inclusive suscitando ao órgão de classe dos Advogados a adoção de sanções administrativas, mas deve abster-se de exercer diretamente essa atividade de controle disciplinar. 5. Recurso a que se dá provimento, para conceder a ordem de segurança.19
1. Intimado para comparecer à audiência de interrogação do acusado, deixou o patrono de fazê-lo, sem justo motivo, comprometendo o bom andamento do processo e a ampla defesa do réu, impondo, assim, a aplicação da penalidade de multa prevista no art. 265, caput, do CPP. 2. Não se vislumbra inconstitucionalidade do art. 265, caput, do CPP, ou ofensa aos princípios do juiz natural, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, em se tratando de sanção de natureza processual, incluindo-se na esfera de discricionariedade regrada do juiz natural do processo, sendo exercidos a ampla defesa e o contraditório através da possibilidade de impugnar a decisão atacada por pedido de reconsideração ou mandado de segurança. 3. Evidenciada a ausência de ofensa a direito líquido e certo do advogado, ora recorrente, refoge à via mandamental determinar a suspensão da multa arbitrada. 4. Recurso Ordinário a que se nega provimento.20
1. Prevê o art. 265, caput, do Código de Processo Penal, que "[o] defensor não poderá abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais sanções cabíveis". 2. No caso, as próprias Recorrentes, em suas razões, revelam que deixaram de atender a dois chamados judiciais para apresentarem peça defensiva, sequer esclarecendo ao Juízo que o Réu havia dispensado seus serviços. 3. Restando claro que não havia notícia nos autos de que as Recorrentes foram dispensadas pelo Réu de patrocinarem sua defesa, não há como infirmar o fundamento correto da Juíza a quo de intimar as Advogadas para praticar ato processual, sob pena de multa. As Recorrentes não atenderam, ainda, à determinação de que, ao deixar de defender causa criminal, o Causídico comunicará previamente ao Juiz. 4. Quanto à alegação de que não lhes teria sido oportunizado o exercício do contraditório, antes de que a multa por abandono de causa fosse aplicada, mencione-se, inicialmente, que a Jurisprudência desta Turma ainda é vacilante no ponto. Em sentidos opostos, os recentes julgados: RMS 31.966/PR, Rel. Min. ADILSON VIEIRA MACABU - Desembargador convocado do TJ/RJ -, DJe de 18/05/2011 e RMS 32.742/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 09/03/2011. 5. Entretanto, na espécie, tal discussão é completamente desinfluente à solução da controvérsia, pois as Recorrentes foram expressamente intimadas e advertidas pela Juíza monocrática de que, se repetissem a omissão de não se manifestarem nos autos, estariam sujeitas à pena de multa a que se refere o art. 265, caput, do Código de Processo Penal. Não resta configurada, assim, qualquer ofensa ao due process of law. 6. Recurso desprovido.21
Atente-se para o fato de que, nas decisões transcritas em que a segurança fora concedida, nunca se declarou a inconstitucionalidade do art. 265 do Código de Processo Penal – o que não poderia ser realizado, em face das mesmas terem sido proferidas por órgãos fracionários das respectivas Casas de Justiça e da cláusula de reserva de plenário, prevista no art. 9722 da Constituição Federal –, mas tão-somente se deu a interpretação mais escorreita ao entelado dispositivo.
Dessa forma, verifica-se, com clareza solar, que todos os Tribunais Regionais Federais, bem como o Superior Tribunal de Justiça, entendem que constitucional o art. 265 do Código de Processo Penal, e que somente deve ser aplicada a respectiva multa quando o defensor manifestar, através de seus atos, o intuito de abandonar o processo, conferindo-se o contraditório e a ampla defesa, como anteriormente defendido
REFERÊNCIAS

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Temas de direito processual. 7. série. São Paulo: Saraiva, 2001.
MENDONÇA, Andrey Borges de. Nova reforma do Código de Processo Penal: comentada artigo por artigo. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

1 Art. 133 da Constituição Federal: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

2 Art. 5º, XIII, da Constituição Federal: “É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

3 Art. 5º, LIV, da Constituição Federal: “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

4 Art. 5º, LV, da Constituição Federal: “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

5 Art. 7º, IV, da Constituição Federal: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim”.

6 Art. 103, § 3º, da Constituição Federal: “Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado”.

7 Art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal: “A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

8 Art. 49 do Código Penal: “Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. § 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário”.

9 Tribunal Regional Federal da 1ª Região, 2ª Seção, Mandado de Segurança nº 0014546-46.2010.4.01.0000/AC, rel. Desembargador Federal Tourinho Neto, decisão unânime, julgado em 03/11/2010, DJ de 12/11/2010, p. 13.

10 Tribunal Regional Federal da 1ª Região, 2ª Seção, Mandado de Segurança nº 0039346-07.2011.4.01.0000/MG, rel. Desembargador Federal I'talo Fioravanti Sabo Mendes, decisão unânime, julgado em 28/09/2011, DJ de 07/10/2011, p. 21.

11 Tribunal Regional Federal da 1ª Região, 2ª Seção, Mandado de Segurança nº 0035418-48.2011.4.01.0000/MG, rel. Desembargador Federal Carlos Olavo, decisão unânime, julgado em 26/10/2011, DJ de 18/11/2011, p. 11.

12 Tribunal Regional Federal da 1ª Região, 3ª Turma, Recurso em Sentido Estrito nº 2009.43.00.005217-6/TO, rela. Desembargadora Federal Assusete Magalhães , decisão unânime, julgado em 10/11/2011, DJ de 18/11/2011, p. 379.

13 Tribunal Regional Federal da 2ª Região, 1ª Turma, Mandado de Segurança nº 2009.02.01.011133-4/RJ, rel. Desembargador Julio Mansur (Juiz Federal convocado), decisão unânime, julgado em 27/01/2010, DJ de 01/03/2010, p. 89.

14 Tribunal Regional Federal da 2ª Região, 1ª Turma Especializada, Mandado de Segurança nº 2010.02.01.015096-2/RJ, rel. Desembargador Aluisio Gonçalves de Castro Mendes (Juiz Federal convocado), decisão unânime, julgado em 26/01/2011, DJ de 01/02/2011, p. 4.

15 Tribunal Regional Federal da 2ª Região, 2ª Turma Especializada, Mandado de Segurança nº 2011.02.01.003548-0/RJ, rel. Desembargador Federal Marcello Ferreira de Souza Granado (Juiz Federal convocado), decisão unânime, julgado em 21/06/2011, DJ de 01/07/2011, p. 124-125.

16 Tribunal Regional Federal da 3ª Região, 1ª Turma, Apelação Criminal nº 0009574-07.2003.4.03.6181/SP, rel. Desembargador Federal Alessandro Diaferia (Juiz Federal convocado), decisão unânime, julgado em 10/04/2012, DJ de 18/04/2012.

17 Tribunal Regional Federal da 4ª Região, 8ª Turma, Correição Parcial nº 2009.04.00.042906-8/SC, rel. Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus, decisão unânime, julgado em 09/06/2010, DJ de 17/06/2010.

18 Tribunal Regional Federal da 5ª Região, 1ª Turma, Apelação Criminal nº 200881000035768/CE, rel. Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira, decisão unânime, julgado em 01/10/2009, DJ de 12/02/2010.

19 Superior Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 32742/MG, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão unânime, julgado em 15/02/2011, DJ de 09/03/2011.

20 Superior Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 31966/PR, rel. Min. Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado), decisão unânime, julgado em 14/04/2011, DJ de 18/05/2011.

21 Superior Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 31178/RS, rel. Min. Laurita Vaz, decisão unânime, julgado em 20/03/2012, DJ de 29/03/2012.

22 Art. 97 da Constituição Federal: “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.

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